“Israel responderá com força aos hackers que danificarem a ‘cyber soberania’ israelense” – Danny Ayalon, Vice Ministro das Relações Exteriores de Israel.
A declaração acima, do Sr. Ayalon, foi o que mais me intrigou enquanto lia no site do Estadao uma interessante notícia sobre a Internet ser a nova frente de batalha de Israel. Foi a primeira vez que vi o uso da expressão “cyber soberania” ser empregada no sentido de atrelar o domínio/território virtual ao poder soberano do Estado.

Bom, antes de fazermos uma incursão pelo conceito de soberania definido pelo Direito Internacional, é importante que entendamos o que está acontecendo na terra prometida. A notícia do Estadão diz que “uma série de ataques de hackers vêm acontecendo neste início de ano e as Forças Armadas [israelenses] já reforçaram suas unidades cibernéticas para lutar contra os piratas da rede” (piratas árabes, ao que parece). E esse reforço incluiria o recrutamento de unidades de elite, formadas por peritos em informática, que liderariam a luta contra os ataques cibernéticos dirigidos aos sites israelitas (governamentais, privados, e até pessoais). Ao que tudo indica, o “toma lá, dá cá” entre Israel e árabes palestinos subiu mais um nível, e agora alcançou o ciberespaço (quiçá um dia chegue ao próprio Céu e aos domínio divinos). É certo e lógico que, com a crescente dependência do mundo contemporâneo em relação à internet e seus mecanismos virtuais, faz todo o sentido que essa guerra interminável entre árabes e judeus se desloque para os domínios virtuais. No entanto, é interessante notar que os conceitos pelo qual exprimimos a realidade parecem estar cada vez mais atrasados e obsoletos, se tomarmos em conta as inúmeras novas situações de fato trazidas com o advento global da internet e que carecem de uma melhor teorização.
Volto agora ao conceito de soberania. Conceito este que está na raiz das declarações do ministro israelense, e que faz o Estado de Israel se arvorar no direito de se defender e de também atacar o ciberespaço alheio, baseado na defesa da própria soberania israelense. Desde já, o problema que se coloca aqui é o de conciliar o conceito tradicional de Estado e seus elementos: população, território e governo; e a mas importante das suas características: a soberania/independência (a kompetenz kompetenz de Jellinek), com a tal cibersoberania. Pois, imaginando que o Estado seja detentor da cibersoberania, como vamos definir onde e até que ponto o Estado pode exercer a sua soberania dentro do ciberespaço? Qual é, e como se delimita, o “território virtual” do Estado? Quais as competências “cibersoberanas” do Estado dentro desse espaço? Como o Estado defende esse seu território? Quais os limites dessa defesa? O Estado pode apenas se defender virtualmente ou também pode bombardear instalações físicas donde provenham ataques contra seu ciberespaço? Infelizmente, ainda não tenho as respostas para esses questionamentos e muitos outros que vão surgindo em minha cabeça, mas penso que seja uma temática importante para ser pensada e desenvolvida.
Percebo que, com a declaração do Sr. Ayans, o ciberativismo também pode ser um ciberativismo estadual, acabando definitivamente com a ideia da internet como um espaço de todos e de ninguém. Ou seja, além do Estado submeter as ações virtuais a uma regulamentação legislativa, trata-se agora de submeter o próprio mundo virtual à sua soberania, ou, cibersoberania. E, a principal consequência disso, é exatamente a possibilidade de se considerar um ataque hacker um verdadeiro ataque direto contra a soberania estadual, justificativo de sabe-se lá quais ações de legítima defesa (?) do ciberespaço e indiretamente do próprio espaço físico do Estado. Tudo isso alça os problemas e disputas da internet, até agora majoritariamente privados, a um novo patamar com toda uma distinta gama de efeitos, efeitos interestaduais.
Mas, até que a Ciber-ONU se pronuncie acerca da guerra digital entre judeus e árabes, cabe a nós, acadêmicos, perquirir e investigar as implicações que a declaração do Ministro Ayans deve trazer aos conceitos tradicionais do Direito Internacional. O mundo físico já não é mais suficiente para a humanidade, que cria os seus próprios mundos agora, e precisamos descobrir como transferir a regulamentação da realidade física e concreta para a realidade virtual. Ou, quem sabe, até inventar novas formas de regulamentação.
