As violações de Direitos Humanos no caso Catar vs. Emirados Árabes Unidos submetido perante a Corte Internacional de Justiça

Por Pablo Domingues de Mello,

No dia 12 de junho de 2018 o Estado do Catar ajuizou uma representação contra os Emirados Árabes Unidos na Corta Internacional de Justiça (CIJ).

O motivo? Catar alega que os Emirados Árabes Unidos (EAU) violaram diversas disposições legais da Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial (CEDR) de 21 de dezembro de 1965. Segundo narrou o Catar em sua representação, os EAU expeliram todos os cidadãos do Catar que residiam no país; proibiu eles de entrar ou passar pelos EAU; fechou o espaço aéreo e os portos tanto para o Catar, como seus cidadãos. Ainda, interferiu dentro dos direitos dos catanianos que possuem propriedade nos EAU; limitou os direitos dos catanianos de expressão que apoiam ou são contra as medidas adotadas pelos EAU e, por fim, fechou todos as desses da Al Jazeera Media Network, bem como bloqueou as transmissões de Al Jazeera e de outras mídias do Catar.

Porém, não se trata apenas dessas ações. Ainda, o Catar alega que os EAU teriam violado os artigos 2, 4, 5, 6 e 7 da CEDR tomando as seguintes medidas:

(a) expulsar, coletivamente, todos os catanianos, bem como proibindo-os de entrar, no território dos EAU por conta da nacionalidade deles;

 (b) violando outros direitos fundamentais, incluindo o direito de casamento e a escolha do esposo/esposa, liberdade de expressão e opinião, saúde pública e cuidados médicos, educação e treinamento, propriedade, trabalho, participação em atividades culturais e tratamento igualitário perante os tribunais;

 (c)  falhando em condenar e, ao contrario, encorajando o ódio racial contra o Catar e os catanianos e falhando em tomar medidas para combater os prejuízos, incluindo: criminalizando a expressão de simpatia com o Catar e catanianos; permitindo, promovendo e financiando uma campanha publica e midiática internacional anti-Catar; silenciando a mídia catariana; e convocando ataques físicos contra entidades do Catar; e

(d) falhando em prover proteção efetiva e recursos para os catanianos procurarem reparação contra atos de discriminação racial através das instituições e cortes dos EAU.

Com isso, o Estado do Catar requereu à CIJ que cessasse e revogasse as medidas discriminatórias, incluindo as leis nacionais dos EAU que descriminem de fato e de direito os cidadãos do Catar baseadas em suas nacionalidades. Ainda, pediu a imediata cessão de todos as medidas de censura contra a mídia do Catar, que elimine todas as formas de discriminação contra os catanianos, com base na CEDR, impedir os EAU de tomarem qualquer medida que podem causar discriminação contra os catanianos dentro da jurisdição ou controle dos EAU.

Ainda, em 11 de junho de 2018, consoante o artigo 41 do Estatuto da CIJ e os artigos 73, 74 e 75 das Regras da CIJ, o Catar preencheu uma Requisição para medidas provisórias “para proteger contra outros prejuízos irreparáveis contra os direitos dos catanianos e seus familiares com base na Convenção sobre a Eliminação de fodas as formas de Discriminação Racial e prevenir o agravamento ou extensão da disputa”. Catar clama que “os diversos direitos do Qatar que estão sendo discutidos na presente disputa estão sendo ameaçados com ferimentos iminentes e irreparáveis pelos EAU.”

Nas audiências que foram realizadas em junho de 2018, os Emirados Árabes Unidos alegaram perante os juízes da Corte Internacional de Justiça que a crise foi causada pelo Catar por se recusar a deixar de apoiar e financiar organizações como Al Qaeda, Al Nusra, Hamas e Irmandade Muçulmana, entre outras questões. Por oito votos a favor e sete contra, a Corte ordenou que os EAU permita a reunificação de famílias mistas entre emiratenses e catanianos afetados pelas medidas tomadas a partir de 5 de junho de 2017.

Os estudantes que foram expulsos também terão a possibilidade de voltar aos EAU para terminarem seus cursos, ou, caso contrario, os centros educativos deverão lhes oferecer acesso a seus expedientes para que possam continuar com a sua formação em outro país.

Além disso, os juízes exigiram que EAU permitam os catarianos a terem acesso aos seus sistemas de justiça nacional para que exerçam seus direitos como cidadãos.

Por último, e por 11 votos a favor e quatro contra, a CIJ reivindicou aos dois Estados que “se abstenham de tomar medidas que agravem a situação atual”, disse o juiz presidente, Abdulqawi Ahmed Yusuf, na leitura da sentença.[1]

As desavenças entre Catar e Emirados Árabes Unidos não é recente. Já em agosto de 2017 o Qatar enviou uma representação contra os EAU, o Bahrein e a Arábia Saudita perante a Organização Mundial do Comercio (OMC). Porém, as tensões entre os Estados se acirraram quando os EAU tomaram as medidas racistas descritas acima. Em junho do mesmo ano, os EAU ameaçaram prender qualquer pessoa que demonstrasse simpatia para com o Catar, dando-lhes punições de ate 15 anos de prisão, bem como impedindo a entrada de catarianos no território dos EAU. Tais sanções são justificadas pelos EAU pois, supostamente, o Catar estaria apoiando o Irã e outros grupos radicais islâmicos[2].

A situação na região é crítica e tem caminhado para um cenário mais preocupante em relação aos Direitos Humanos. As atitudes tomadas pelos EAU e países da região evidencia uma disputa política que afeta o campo das liberdades individuais dos cidadãos do Catar e viola seus direitos. Proibição de livre trânsito, acesso à educação e aos meios de justiça, bem como violações do direito de casamento são algumas das medidas anti-humanitárias adotadas pelos EAU, como exposto acima. Sendo assim, é importante salientar que nenhuma disputa no campo político dos governos deve ou pode estar acima dos Direitos Humanos internacionalmente reconhecidos, sendo cabível aos Estados que violarem tais direitos as sanções previstas no Direito Internacional.

Agora, cabe a Corte Internacional de Justiça julgar a demanda a ela submetida, reconhecendo eventuais violações aos Direitos Humanos e demais acordos internacionais assinados pelos dois países.

A Corte Internacional de Justiça é o principal órgão jurisdicional da Organização das Nações Unidas (ONU) e exerce jurisdição sobre todos os Estados membros da ONU, incluindo o Catar e os EAU. Tem capacidade de condenar os Estados-Membros a tomarem medidas que venham a cessar o conflito, bem como declarar violações às regras e normas de Direito Internacional.

Para complementar a leitura:

Estatuto da Corte Internacional de Justiça: https://nacoesunidas.org/carta/cij/

Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial: http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cdhm/comite-brasileiro-de-direitos-humanos-e-politica-externa/ConvIntElimTodForDiscRac.html

Representação do Catar contra os Emirados Árabes Unidos perante a Corte Internacional de Justiça e outros documentos: https://www.icj-cij.org/en/case/172

[1] https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/efe/2018/07/23/corte-da-onu-ordena-aos-emirados-arabes-a-reunificacao-de-familias-catarianas.htm

[2] https://extra.globo.com/noticias/mundo/emirados-arabes-unidos-aumentam-pressao-sobre-catar-ameacam-prender-simpatizantes-21445641.html

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