Discurso de ódio versus liberdade de expressão: Análise de decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul sobre incitação ao ódio em redes sociais

Por Isadora Balestrin Guterres

O julgado analisado foi objeto de recente decisão, no dia 14 de agosto de 2023, pela 10° Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. O Relator Túlio de Oliveira Martins julgou de forma monocrática o Agravo Instrumento Interposto por J.A.V.O contra decisão que determinou o bloqueio de suas redes sociais Instagram e Tik Tok nos autos ordinários da ação indenizatória ajuizada pelos Autores, ora Agravados.

Nas razões recursais apresentadas pelo Agravante, este alegou ter cumprido a determinação pelo juízo a quo, isto é, de exclusão de postagens e marcações de suas redes sociais, todavia, ressaltou que as novas publicações não vincularam nem mencionaram os nomes dos autores da ação.

O Relator do caso, em sua fundamentação, ressaltou que a ação indenizatória teve origem em razão da parte Ré/Agravante ter divulgado o número de telefones dos Autores/Agravados nas referidas redes sociais, incitando o ódio para que seus seguidores cobrassem uma dívida decorrente de uma batida de carro causado por um dos Autores em face do Réu. Porém, em razão dessa exposição, os Autores receberam inúmeras ameaças, bem como sofreram ampla humilhação no ambiente virtual.

Acerca do caso, o Relator destacou se tratar de uma situação sui generis, visto que além da conduta do Agravante ser extremamente grave, visto que expôs informações pessoais dos Agravados e, concomitante, incitou o ódio em face destes mediante manifestação em suas redes sociais, aquele já havia descumprido deliberadamente determinações judiciais, demonstrando não haver limite em seu comportamento. Nesse sentido, acertado a ponderação entre liberdade de expressão e discurso de ódio estabelecida na decisão, a qual ressalta que:

“As informações pessoais dos autores foram divulgadas em domínios na rede mundial de computadores, alcançando uma vasta gama de pessoas, ultrapassando em muito aquilo que se pode configurar uma livre, justa e ponderável manifestação de pensamento, cujas expressões empregadas não se deram em observância às demais garantias constitucionalmente previstas, tais como a honra, a moral, a imagem, a dignidade e a respeitabilidade do cidadão, estes que se tem como valores e preceitos igualmente protegidos como princípios basilares do Estado Democrático de Direito.
O direito à liberdade de expressão não pode servir como escudo a avalizar o discurso ao ódio e o fomento à incitação pública, afrontando a dignidade dos autores e ainda o direito à liberdade e à vida, tendo em vista que as inúmeras ameaças recebidas poderiam ter sido colocadas em prática”. [Grifo nosso] (BRASIL, 2023)

Essa ponderação estabelecida na decisão sobreveio acertadamente ao caso, além de estar em consonância com o ordenamento jurídico brasileiro. Ao ressaltar que a manifestação proferida nas redes sociais ultrapassou os limites que correspondem ao direito de expressar-se de forma livre, violando a dignidade da pessoa humana, e, adentrando a esfera de um discurso de ódio, a decisão ressaltou o caráter não absoluto da liberdade de expressão.

Diante dessa ponderação estabelecida da liberdade de expressão enquanto direito fundamental de caráter não absoluto, sobretudo quando diante de discursos que incitam o ódio e violam a privacidade, a honra, a imagem e o nome das pessoas, o Relator do caso negou provimento ao recurso.

(BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n° 5219856-65.2023.8.21.7000/RS. Relator Túlio de Oliveira Martins. 10a a Câmara Cível. Julgado em 14 de ago. 2023).

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